Sob disfarce na padaria

Eu te reconheci, Artur, quando entrou como uma brisa na padaria de esquina em que eu estava. Distingui a cor do cabelo, o jeito educado e tímido de falar e a curiosidade pelas coisas.

Mas você usava disfarce de menina e levava em uma das mãos caixinhas de Mentos que pudesse vender a estranhos. Estive a ponto de revelar a sua verdadeira identidade, mas me segurei para ver como se sairia na pele da menina.

Recusei o Mentos, o que não a abateu. Ela girou pelo salão, imune às sucessivas negativas dos outros, até que se postou de novo diante de mim, sem insistir nas balinhas mentoladas, mas com um pedido de coração.

— Você pode me dar um suco?

— De quê?

— Um suco — repetiu com delicadeza.

— Eu sei, mas de quê?

— Um suco de laranja. De laranja com beterraba, tem? — escutei tocado pela candura.

O disfarce causou estranheza aos funcionários, desconfiados da presença dela ali. Pesou na balança a determinação com que saiu de perto de mim em direção à outra ponta do balcão para fazer perguntas que não pude ouvir ao rapaz que preparava o suco. Como uma menina, que dava toda a pinta de viver na rua, a vender Mentos, bancava tanta liberdade?

Percebi o desconforto e as primeiras expressões recriminatórias. Estavam a ponto de enxotá-la dali. Intervi a distância, dando a entender que a situação seguia controlada e todos ficariam bem, que a tal menina, mais baixa do que a altura do balcão, estava sob meus cuidados.

Não vi sua expressão ao receber o copo para viagem, mas posso imaginar. Ela tinha pressa já, supus pela deslizada até a porta. Os movimentos todos do pequeno corpo a guiavam para a rua, onde aquela bebida roxa, que fez o eixo do seu mundo se realinhar minimamente, com certeza teria mais cor sob o sol. Ela só queria ir embora dali  e deixar para trás a lembrança do quanto lhe custara um suco ao qual eu e os demais dávamos pouco valor.

E então ela parou com um movimento brusco, torcendo-se em si mesma, como só as crianças sabem fazer, e disse olhando bem nos meus olhos, como só os adultos sabem desaprender:

— Obrigado.

Agora vou contar a verdade, Artur. Você nunca esteve naquela padaria. Muito menos se disfarçou de menina que gasta a infância a vender Mentos. Mas ela é real, esteve lá e me pediu o suco.

Fui eu quem a disfarçou de você, seguindo os conselhos do meu coração. Ele queria ver se eu agiria com ela como faço contigo, sem indiferença ou preconceito. A delicadeza da menina era um espelho da sua, como também a vontade de comer comida gostosa de padaria.

Aprendo com seu crescimento a respeitar desejos de criança, talvez os mais sinceros da nossa espécie. Sei que não posso salvar o mundo, mas naquele dia depositei toda a minha esperança no poder do suco roxo enriquecido com vitaminas de fortalecer a menina. E não importa que ela seja uma entre milhões. Ela era e estava lá, como você é e está aqui; isso explica tudo.

Em nenhum momento, e vale dar atenção às minhas palavras, senti pena. A minha identificação imediata, à parte de ela ter me lembrado da dinâmica que leva uma criança a ter menos do que merece, foi porque sou pai. Toda vez que vejo uma criança, vejo você, uma sensibilidade que desenvolvo mais e mais aos pouquinhos.

No post Eu, papai. Eu, Artur deste blog, eu te pedi para não se esquecer das afiadas palavras escritas por Fitzgerald:

— Sempre que tiver vontade de criticar alguém — ele disse —, lembre-se de que ninguém teve as oportunidades que você teve.

O Grande Gatsby, de F. Scott Fitzgerald

Pois faça isso, Artur. Tente não se esquecer jamais.

— Obrigado.

1 comentário em “Sob disfarce na padaria”

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