A doce infância da minha infância era mais livre, como cachorro solto na praia. Nossos pais se distraiam entre eles, enquanto vivíamos para ser crianças, atirando objetos uns contra os outros, escalando prateleiras e brincando com fogo quente. Uma farra!
Enquanto isso, ninguém dava a mínima para nós, deixados à própria sorte. E éramos muito felizes, obrigado!, salvo as raladas nos joelhos e cotovelos, coisa que você só foi descobrir aos quatro anos, Artur. Sinal dos tempos!
Nesta infância minha sem coleira, a alimentação saudável era pouco nutritiva, mas colorida, pegajosa e perfumada a tutti-frutti. Todos comíamos porcarias deliciosas que eram autênticas explosões de sabor com muita energia, potencializadas por corantes, aromatizantes e gordura trans.
Infância muito doce
Éramos cobaias da indústria por vocação e gosto desorientadas no labirinto das contraindicações e dos efeitos colaterais. Nossas cáries, alergias e taquicardias marcaram geração disparando alarmes nos laboratórios de fabricantes em todo o país, que por cautela decidiram pegar mais leve nas formulações.
Deu no que deu. Amaldiçoe-nos se quiser pelos doces salgados e pálidos de hoje. Sorry.
E como os pais não devem mentir para os filhos, muito menos ter vergonha do que já fizeram – ou comeram, no caso –, você está na idade para encarar a verdade. Eu ingeri quilos destas coisas que verá a seguir, muitas delas nocivas aos dentes e ao desejável funcionamento do sistema digestivo.
Eram compulsões embaladas que tragávamos às escondidas na escola ou na cozinha e até em público, quando pais e mães, resignados muito a contragosto, engoliam nossas obsessões açucaradas sem objeção.
Prepare-se para um lado obscuro meu. Mas cheio de sabor.
O universo numa casca de amendoim
Sobrevivente da Era de Ouro das guloseimas, o Dadinho é hoje menos Dadinho do que nunca. O gosto a amendoim morre no cheiro e a textura mais parece com a de miolo de pão amassado.
Na minha época, o amendoim e o açúcar eram de verdade, juro.
Bombas-relógio sortidas
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Muito coloridas, reluzentes e enormes. Mas como o canto das sedutoras sereias, podiam matar. Muitas crianças sufocaram com balas Soft na garganta. Tempos selvagens em que a indústria, como os pais com suas crianças, não pensava nas consequências.
É, mas não é
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Na verdade, os pirulitos Zorro, embalados com papel metálico, eram um mistério para mim. Nem cremosos como caramelo nem sólidos como pé de moleque, tinham textura quebradiça desafiadora porque muitas vezes deixei cair no chão pedaços suculentos entre mordida e outra. 🙁
Asas à imaginação
Os Pirocópteros nos faziam olhar para o céu, onde a imaginação dá mais piruetas. Ou seja, pura diversão na infância doce: desvendar os mistérios da aerodinâmica, cuidar para não acertar os olhos e praguejar contra aquele armário pesado atrás do qual o Pirocóptero teimava em cair. Ah, e tinha o pirulito.
Gosto da vida adulta
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Mentex e balinhas Garoto mexiam comigo. Elas eram, para mim, coisa de adulto porque saíam de bolsos e bolsas dos mais velhos. Nós, crianças, não íamos às vendinhas pedir uma Mentex ou pastilhas Garoto. Não, o que é bom é proibido. 😉
Azedo, mas docinho
Tudo pode no começo da vida. O refinanciamento só vem com idade. Daí a gostarmos tanto de Azedinho Doce Morango, uma coisa que mais parecia parafina com pinta de chiclete. Além de açúcar, o corante e o aromatizante reinavam na boca, que não entendia isso de doce azedo. Mas adorava!
Muuuuuuuuuuu
Vaca amarela
Pulou a janela
Quem falar primeiro
Come a bosta dela
#SQN. A vaca é marrom mesmo no Brown Cow, substância viscosa viciante que mais parecia açúcar derretido no ponto certo para escorrer da embalagem e apagar qualquer sorvete, por mais gostoso que fosse. ⚡⚡Raio gourmetizador na calda de chocolate!⚡⚡
Mas no fim, a coisa se transformava em sorvete no Brown Cow, e não o contrário.
Só escondido
A minha mãe não era fã de chicletes. Que mãe é?! Estes Chicletes Mini eram a transgressão colorida de amarelo, rosa, verde etc.
Você fazia cuia com a mão e despeja um arco-íris de sabores do saquinho, sempre com a vontade de comer mais, mais, mais, mais… Entende-se porque as mamães não eram fãs. 🙂
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A minha infância doce teve muitos mais sabores, Artur. Muitos mais coloridos, artificiais e cheios de sabor. Mas os que realmente ficam na memória são os que nenhuma vendinha ou supermercado vende.
A infância é feita de sabores da vida, dos momentos com os nossos pais, avós e amigos que descobrimos na escola e fora dela. Você terá as suas próprias memórias de chicletes, biscoitos, balas e outras guloseimas, mas o que realmente espero é que consiga reunir lembranças dos verdadeiros gostos da vida. 😉