Era uma vez alguém que via o mundo em cores mais vivas. E que se alegrava por isso. Esse alguém não segurava os sentimentos. Para quê? Se é para rir, que seja de gargalhada. Mas se for coisa ruim, uma boa negativa serve.
A leveza era a sua marca, mesmo quando tudo ficava pesado, difícil de carregar. Esse alguém só sabia fazer assim, ser das pessoas que desapegam. Um dom que poucos têm – ou se lembram de usar.
Os mais próximos adoravam suas tiradas de humor, a espontaneidade e a generosidade com os demais. Gestos simples, mas já desprestigiados em uma época de leva-e-traz do egoísmo nas relações.
The natural state of mammals is to be somewhat on guard. However, in order to feel emotionally close to another human being, our defensive system must temporarily shut down. In order to play, mate, and nurture our young, the brain needs to turn off its natural vigilance.
Bessel van der Kolk, em In The Body Keeps the Score: Brain, Mind, and Body in the Healing of Trauma
Também admiravam outras qualidades que não encontravam em si mesmas, por mais que vasculhassem.
Eram tempos difíceis. Entregar-se de corpo e alma estava ultrapassado, como sentar com tempo para escrever uma carta, lamber o selo e caminhar depois até o correio.
Esse alguém não era perfeito, verdade seja dita. Ninguém é. Desconhecia muitas coisas, e teimava com quem sabia mais.
Mas olhava bem nos olhos, prestava atenção e aprendia com o que diziam, no seu passo, um hábito saudável da curiosidade bem disposta que tinha.
Esse alguém só queria ser verdadeiro no trato com as pessoas, estar junto delas. Traço da sua personalidade autêntica e transparente, como uma lente de aumento. Acrescente a isso o jeito franco de falar, sem meias palavras. Para quê enrolar, se tudo pode vir do coração?
Esse alguém era uma pessoa simples, como dizem, fácil de ler. Sempre descomplicada, comunicativa e atenta. Seu poder vinha da inteligência e da criatividade, dois atributos que saltavam aos olhos dos mais chegados.
Esse alguém, Artur, é você aos quatro anos, com todas as letras. Um presente meu para que se lembre quando a idade chegar.