A corrupção no Brasil é exibicionista na rua, mas bem quietinha em casa, meninos.
Ela age assim há séculos, cultivando uma vida dupla que adoramos copiar desde que o país foi “descoberto”.
Na rua, ela se exibe quando passa a mão em fundos do governo. Ou aparece com a cueca cheia de maços de dinheiro. Ou tem um apartamento abarrotado de malas com milhões em notas.
Em casa, evita chamar a atenção ao pagar a doméstica por fora. Ou quando sonega imposto dizendo que está mais do que certa porque “já pagamos impostos demais”.
Mas não importa onde, a corrupção é muito bem relacionada. Todos apertam sua mão, com menos ou mais nojinho. Tem gente que até senta à mesa para tratar de negócios com ela.
E o combinado é fazer pose de “ninguém viu, ninguém vê”.
Mas o que é a corrupção no Brasil?
Ela é onipresente, meninos. Bem folgada e sem limites. Simples assim.
Além da vida dupla, é uma camaleoa descolada. David Bowie sentiria inveja! A corrupção aqui tem duas caras. Milhões delas! E jamais repete o visual – nenhuma vez!
Junte dez brasileiros em uma sala para falar do assunto e vocês terão dez retratos falados diferentes da corrupção! 🙄 Que aparência difusa! Um unicórnio, quase.
E quem diz ter visto – nunca participado! –, fez à distância. Ou seja, a corrupção está sempre bem longe no vizinho, na repartição pública ou no governo, mas nunca em nós.
Com uma vida dupla, além de inveterada camaleoa, ela também vive sem carteira!
Isso, meninos. A corrupção no Brasil não tem pai nem mãe. Ninguém assume responsabilidade por ela, que corre solta dentro e fora de casa.
Todos a repreendem e a condenam, mas fica por isso. Poucos a puxam de canto para entender o que está acontecendo e educá-la, como bons pais fazem com os filhos. Ela mais parece um vira-lata: amada, mas sem dono.
Onde a corrupção começa?
Em casa, onde mais?!
Os portugueses a trouxeram a tiracolo. E como eles, ela se adaptou muito bem à terra brasilis.
Juntos, constituíram um lar harmonioso. Juntos, sambaram para a sociedade, como se não houvesse amanhã.
Mas o amanhã sempre chega. Até os dias de hoje, como podemos ver. Após tantos anos se divertindo no Brasil, a corrupção arrumou um cantinho na casa de cada brasileiro.
Tudo na camaradagem! Sem caô! De boa! Só no sapatinho! Ela fica onde quer, do barraco à mansão, passando pelas ruas no caminho. Tá tudo dominado.
Mas percebam: a corrupção no Brasil começa no aconchego do lar.
Quem espalha a corrupção?
Se ela começa em casa, somos nós pais e mães que a espalhamos primeiro.
Sabe como, Artur e Bento? Dando maus exemplos. Exemplos: ligar a TV como suborno pelo silêncio de vocês, abusar da autoridade de pais para intimidar e negligenciar atenção em benefício próprio.
Bem rápido, vocês também ficam amiguinhos da corrupção no Brasil. O coleguinha que fura a fila no escorregador, por exemplo, já entrou na brincadeira.
Começa então o contágio, como resfriado de escola no inverno. Em poucos anos, vocês aprendem a corromper.
Pior, desenvolvem a habilidade de negar.
— Foi ele!
— (…).
— Corrupto!
— (…).
— Não fui eu!
Não sei se é um mea culpa, porque o brasileiro coloca a culpa nos outros. Ela acha que as outras pessoas estão fazendo um voto de baixa qualidade.
Dá para evitar?
Dá, mas tem que se esforçar. A começar por mim e pela sua mãe. Os pais devem assumir a liderança, puxar o bloco.
E sem cair em tentação. Vocês escutarão muito o diabinho dizer que é só uma vez.
— Ninguém vai perceber. Vai, faça!
Tapem seus ouvidos para o diabinho, mas abram bem os olhos. A corrupção só acontece se vocês forem fios condutores.
Sejam como uma borracha de apagar para cortar a corrente. Sem energia, a corrupção perde brilho até quase apagar.
Um país com menos corrupção – porque ela sempre existirá – seria melhor. A começar pelas pessoas, que são as primeiras a propagar o vírus.
Cidadãos menos corruptos seriam mais altruístas. E sinceros: não adianta culpar os outros, como o governo ou o vizinho, ou bater panela da sacada e votar em paladinos da ditadura.
A corrupção começa em cada um de nós.
Moral da história
Somos todos corruptíveis e corruptos. De um jeito ou de outro. Mas fazemos que não, culpando os outros.
Tá na hora de encarar a verdade. E jogar limpo com vocês, nossos filhos. Artur e Bento, não nego: levo a corrupção dentro de mim também.
Mas uma coisa mudou desde que vocês nasceram. Uma coisa que não sei explicar, embora tenha uma ideia. Hoje, corromper é uma fraqueza que tento controlar mais do que nunca.
Como deveria e deve ser. E se cada pai e mãe pensar assim, quem sabe o mundo de vocês, meninos, fique menos contaminado pela corrupção.